Se por um lado férias são sinónimo de descanso e de cortar com a rotina do dia a dia, quando se tem filhos ou crianças por perto, nem sempre é fácil conseguir os tão desejados momentos de tranquilidade. Se os pais passam o ano inteiro a desejar que o momento das férias chegue, o mesmo acontece com as crianças, que vêm as férias com os pais ou com outros adultos com quem costumam estar de férias, como uma oportunidade de estarem mais próximas dos pais e de poderem fazer coisas em conjunto que normalmente não fazem.
O que acontece atualmente é que geralmente esta proximidade e companhia entre adultos e crianças é apenas aparente, uma vez que apesar de se partilhar o mesmo espaço, a presença e a atenção, na maioria das vezes, está centrada nos aparelhos eletrónicos como o telemóvel, o tablet ou a playstation. Há mais partilhas no Facebook, Instagram e Whatsapp do que propriamente a partilha de tempo, de experiências e de afetos.
Os aparelhos tecnológicos não são exclusivos do mundo lúdico das crianças e jovens do século XXI, sendo algo que tem acompanhado o crescimento das últimas gerações. Nas décadas de 80 e 90 (gerações da maioria dos pais de hoje em dia), já muito do tempo das férias era passado em frente à TV a pôr os episódios do Dragon Ball em dia, ou a ultrapassar os níveis do super mario bros, do tétris e do pac-man.
Um baralho de cartas, uma caixa de loto ou de dominó, jogos de tabuleiro como o monopoly, damas ou xadrez faziam parte da decoração de qualquer casa. Muitos destes jogos, jogados entre amigos ou família, preenchiam os serões das férias, animando e aproximando verdadeiramente as crianças dos adultos que se dedicavam àqueles momentos para se divertirem, apesar do cansaço da praia ou dos passeios típicos das férias de verão. É provável que os adultos se divertissem mais do que as crianças, ficando o gostinho de na noite seguinte haver a desforra saúdavel de quem tinha perdido no dia anterior.
Para além de todo este leque de atividades mais individuais ou em grupo, havia todo um mundo lá fora para ser explorado, distante do sofá e das quatro paredes de casa, que apelavam ao sentido de aventura, de descoberta e de criatividade das crianças, e à gestão da frustração de quando de facto não há nada planeado para fazer. Os rapazes com os jogos de futebol, os peões, berlindes ou corridas de carro, as meninas a saltar à corda, ao elástico, a brincar aos pais e às mães, a dançar ou a cantar.
Havia também o quintal dos avós para explorar, a fruta para apanhar e comer e os passeios de bicicleta a perder de vista pela aldeia. Os livros para ler, as músicas para ouvir e… ter vontade de partilhar tudo isso com aquele primo/a ou amigo/a especial que pela distância só era possível ver naqueles dias de agosto.
Nesses momentos, cheios de vida, os jogos e todos os aparelhos eletrónicos não tinham lugar. Talvez não tenha sido assim tão boa ideia diminuir o tamanho destes objetos que hoje se podem levar para qualquer lugar… a ideia de que trazem mais leveza e ocupam menos espaço nas nossas vidas é apenas uma ilusão…
São exatamente os adultos que passaram por estas experiências que de certo deixaram marcas e memórias, sorrisos, cheiros e saudades, que maiores alterações estão a promover na qualidade do tempo passado em família. O que fazem agora os adultos quando supostamente não há nada para fazer? Todos sabemos a resposta… E não sendo a intenção generalizar mas sim refletir, basta visitarmos as redes sociais para percebermos que estão preenchidas de fotografias das praias, das refeições e dos locais em que os nossos familiares, amigos e conhecidos estão a desfrutar dos seus dias de descanso.
Funcionando o telemóvel ou o tablet como um calmante e uma atividade de ocupação dos tempos livres para os pais, claro que isso se estende às crianças também. E quando acaba a bateria? Ou quando por uma tomada de consciência dos pais, resolvem que é necessário um tempo de pausa porque “já estás à muito tempo a olhar para o telemóvel”, o que acontece a seguir? Frases como “que seca!”, “não se faz nada!”, “quando é que chegamos?” são repetidas vezes sem conta e comportamentos de birra ou de impaciência tornam-se num verdadeiro massacre e pesadelo para os pais.
As crianças acham-se no direito de exigir o mesmo que observam os pais fazerem. Se é normal que o tempo dos adultos seja passado a olhar para o telmovel seja no restaurante ou na mesa de casa, as crianças irão tendencialmente repetir esse padrão, tal como fazem com tudo o resto.
Faça a seguinte experiência: tente estar um dia sem interagir ou interagir o menos possível com o seu telemóvel e focar-se mais no/s seu/s filho/s. Nesse dia experimente recuperar jogos como o “peixinho”, a “bisca”, o “STOP”, a “sardinha”, fazer caminhadas com ele/s, cantar, dançar, contar histórias da sua infância e da sua vida, pintar, desenhar, fazer plasticina, andar de bicicleta, jogar à bola, jogar raquetes, ou simplesmente oferecer-lhe o seu tempo perguntando o que lhe apetece fazer consigo, que ideias tem, como quer ocupar esse tempo que têm em comum. Nesse dia, observe quantas vezes o seu filho lhe pede ou está interessado no telemóvel ou no tablet.
E se pela força do hábito ou do desconhecimento ele pedir, explique-lhe que naquele dia o tablet ou o telemóvel só será permitido numa determinada hora que você enquanto adulto irá decidir. Ajude-o a gerir a sua frustração e a recorrer à sua criatividade com ideias que jamais poderia descobrir caso tivesse o telemóvel na mão. Se possível, repita esse dia por mais dias…
Lembre-se do que gostava de fazer quando era criança, que memórias tem das suas férias, o que o/a deixava verdadeiramente feliz… O que acha de poder proporcionar também esses momentos aos seus filhos? Todos os dias tem essa oportunidade…Aproveite, os seus filhos (por mais que possam reclamar), irão agradecer-lhe.
Dias Felizes. Férias Felizes.
Com regras e com amor,
A vossa psicóloga,
Ana Trindade
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