Inteligência Emocional: Ouvir as Emoções
Numa sociedade que privilegia o conhecimento cognitivo, numa vida preenchida de compromissos, em ruído constante, há pouco tempo e espaço para olhar para as emoções. Saber identificar as emoções, os seus sinais e definir estratégias adaptativas e saudáveis para vivenciá-las, parece não ter sido uma prioridade do ser humano nos últimos tempos. E, como todos observamos, isso tem trazido as suas consequências. Basta olharmos à nossa volta e prestarmos atenção ao que se está a passar no mundo, investigarmos sobre os dados de consumo de drogas e medicamentos psicotrópicos, taxas de suicídio e de violência conjugal, observarmos o comportamento das pessoas enquanto estão no trânsito, nas filas do supermercado, onde a intolerância grita cada vez mais alto. E porque as crianças, são o reflexo daquilo que veem, podemos observar o que se está a passar com as nossas crianças e jovens, recorrendo cada vez mais a especialistas com sintomas de ansiedade, de depressão, a indisciplina nas escolas, as queixas de bullying e cyberbullying, demonstrando uma enorme dificuldade de criar empatia com os outros cada vez mais cedo.
As boas notícias são que no seu desenvolvimento, o ser humano possui as ferramentas necessárias para quebrar este padrão, caso seja estimulado nesse sentido.
Mostrar o que se se sente é para os fracos(?!)
Historicamente, o conhecimento das emoções foi sempre algo desvalorizado, pois as emoções eram vistas como algo a esconder, a reprimir, eram encaradas como um sinal de fraqueza. Pode dizer-se que têm havido bastantes evoluções no que diz respeito à alfabetização literal (através da escolarização), da alfabetização funcional (capacidade de utilizar os conhecimentos adquiridos, no sentido de se utilizarem as tecnologias e os processos que as sociedade modernas exigem), mas não tanto no que diz respeito à alfabetização emocional (capacidade de compreender e gerir as emoções). Já Charles Darwin, na sua obra, falou do papel das emoções para a sobrevivência e têm sido vários os autores a valorizar o papel das emoções. Foi Daniel Goleman, na década de 90 que nos fez refletir sobre a importância da inteligência emocional (aspetos como a motivação, auto controlo, gestão de emoções e empatia) para uma vida mais equilibrada e bem sucedida. Goleman, referiu que a inteligência cognitiva contribui em média entre 10 a 20% para o sucesso, sendo os restantes 80/90% atribuídos à inteligência emocional, dando alguns exemplos de líderes cujo QI era bastante elevado, contudo o seu QE estava pouco desenvolvido, verificando-se um impacto negativo na sua vida pessoal e profissional. Começou a questionar-se se ter boas notas ou conseguir resolver uma equação de um grau de dificuldade elevadíssimo, era realmente fator de sucesso e consequentemente, de felicidade e de bem estar?!
Embora a evolução da validação da importância das emoções, esteja a ser um processo lento, começa a haver um chamamento neste sentido, havendo cada vez mais pessoas a recorrer à psicoterapia, terapias alternativas, mindfulness, atividades de autoconhecimento, etc., procurando ajuda para fazer uma viagem dentro de si, dando-se a si mesmos a oportunidade de descobrir caminhos que estão fechados à muito tempo. As alterações dos referenciais do sistema educativo português também caminham neste sentido, prova é o perfil do aluno do seculo XXI, cujas competências lá mencionadas vão nesta direção.
O exprimir aos outros o que estamos a sentir, não é uma questão lamecha, como muitas pessoas ainda considera, mas uma questão de comunicação básica que nos permite interagir de forma adequada e saudável com os outros, evoluir e sobreviver emocional e fisicamente.
O que são emoções e qual o seu papel?
A palavra “emoção”, proveniente da palavra latina “emovere”, significa impulso que convida a atuar. Conforme a emoção que sente, o indivíduo, tenderá a agir de um determinado modo, numa dada altura (Moreira, 2001). A forma como recebemos a informação do meio, desencadeia uma emoção e uma interpretação dessa experiência. Por exemplo, quando recebemos um abraço da mãe, a emoção que sentimos poderá ser a de amor e calma, o que faz com que avaliemos essa situação como algo agradável para nós. A tomada dessa consciência, poderá fazer-nos ter vontade de repetir essa experiência com a mãe e com outras pessoas de quem gostamos. Por outro lado, o medo, poderá ajudar-nos a perceber que nem todas as pessoas são de confiança e que não devemos abraçar todas as pessoas. A mesma situação pode ser vivida de forma diferente por cada pessoa/criança.
Normalmente dividem-se as emoções em emoções positivas e negativas, atribuindo-se uma avaliação depreciativa às emoções como o medo, a raiva, a vergonha, a frustração, a tristeza, etc. Todavia, é importante explicar às crianças que todas as emoções são importantes e devem ser expressadas (de forma adequada), podendo umas ser agradáveis e outras desagradáveis. Quando colocamos as emoções numa escala de “boas” e “más”, as crianças irão tentar corresponder apenas às boas, tendo dificuldade em assumir as emoções “más”. Por outro lado, também se irão sentir “crianças boas” quando expressam emoções agradáveis e “crianças más” quando expressam emoções desagradáveis. Isto leva a que muitas vezes as crianças construam imagens erradas acerca de si próprias e que reprimam as emoções desagradáveis para não desiludir os pais ou figuras de referência, guardando tudo isso no seu inconsciente que depois se manifesta das mais diversas formas: descontrolo dos esfíncteres, desobediência, birras, desconcentração, desmotivação, ansiedade, depressão, entre outras.
As emoções poderão ter várias funções, destacando-se, entre outras:
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Sobrevivência – O bebé chora para que as suas necessidades básicas sejam satisfeitas, para que possa sobreviver. Cada emoção tem a sua função de sobrevivência: o medo ajuda a proteger-nos de situações perigosas, a raiva a identificar os nossos limites e a expressá-los aos outros, a alegria promove sensações de bem estar e de sentido à vida, a tristeza faz-nos desacelerar, e ajuda no recolhimento e introspeção, sendo muitas vezes o motor para mudar algo que precisa de ser mudado. As emoções funcionam como motor das nossas ações, e consequentemente na nossa motivação, sendo esta indispensável à sobrevivência.
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Personalidade – A forma como construímos o padrão de regulação das emoções, contribui para a formação da personalidade. Se a criança aprende a reprimir a emoção Amor, isso irá influenciar a sua personalidade na medida em que é mais ou menos carinhosa, mais ou menos disponível para o afeto.
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Ligação e confiança com os outros -Desde bebés, quando as nossas mensagens resultam numa resposta, a nossa ligação aos outos desenvolve-se. É no reconhecimento das suas emoções e dos outros, que a criança compreende o seu mundo interno e o do outro, é onde existe espaço para a empatia (colocar-se no lugar do outro) e para a construção de relacionamentos com base na confiança e na verdade. É através da segurança que a criança estabelece com o outro e com o mundo, que se irá desenvolver a sua autoconfiança.
Quando é que se desenvolvem as emoções?
Logo após o nascimento, os bebés revelam sinais de perturbação, interesse e repugnância. Nos meses seguintes, estas emoções primárias diferenciam-se em alegria, raiva, surpresa, tristeza, vergonha e medo. A emergência destas emoções parece ser guiada pelo “relógio” biológico da maturação do cérebro (Papalia, Olds, Feldman, 2001). O calendário emocional pode ser alterado por experiências ambientais extremas: crianças maltratadas demonstram medo vários meses antes de os outros bebés (Gaensbauer & Hiant, 1984). Emoções tais como a empatia, ciúme, embaraço, culpa e orgulho, emergem a partir do 2º/3º ano de vida, após o desenvolvimento da autoconsciência. Nesta faixa etária, com a tomada de consciência que “eu” sou uma pessoa, permite que as crianças reconheçam a existência do outro, as suas necessidades e sentimentos, ainda que não sejam ainda capazes de colocar as necessidades do outro em igualdade com as suas.
Um bebé quando nasce, sem conseguir falar, consegue exprimir a sua emoção, e quem é pai/mãe reconhece que, embora incomodativo, o choro é importante na identificação das necessidades dos bebés. O choro pode estar associado à fome, raiva ou frustração e normalmente, os pais, conseguem distinguir o tipo de choro. Com o desenvolvimento, as necessidades e as emoções começam a complexificar-se, contudo até completar cerca de 1/2 anos a criança, ainda não fala. Muitas são as vezes em que os pais desejam que as crianças comecem a falar para poderem dizer o que estão a sentir.
As crianças tendem a ter uma expressão das emoções muito maior do que os adultos, ainda que possa ser pouco adequada aos contextos em que está. Esta adequação desenvolve-se com a capacidade de autorregulação e autocontrolo da criança, que surge por volta dos 3 anos, e necessita de ser ensinada pelas figuras de referência da criança. O feedback que a criança recebe do exterior relativamente à forma como os pais lidam com as suas próprias emoções e a aprendizagem que faz sobre o que está a sentir são o primeiro passo para a regulação emocional.