Quando as crianças começam a dar os primeiros passos sozinhos, quando começam a comer a sopa sozinhos, quando passam da fralda para o penico ou para a sanita ou quando começam a falar, isso geralmente provoca nos pais uma sensação de muita alegria. A constatação de que os filhos estão a crescer e a tornarem-se autónomos tem um sabor agridoce, provocando por um lado, medo e, por outro lado, uma doce sensação de realização. Dizemos aos nossos filhos que estão a ficar muito crescidos quando aprendem a fazer algo novo ou quando já conseguem fazer algo sozinhos que antes carecia de ajuda. Eles, muito orgulhosos de si próprios gostam de espalhar a boa nova por toda a gente: “já sei lavar os dentes sozinho”, “já sei vestir-me sozinho” “a mamã diz que eu sou um crescido porque já não faço birras” e é assim pela vida fora, quando entram para a escola, quando terminam o curso, quando tiram a carta e compram o primeiro carro, quando conseguem o primeiro emprego, quando casam, quando têm filhos, etc.
Ajudar um filho a tornar-se autónomo e independente, capaz de fazer o seu caminho e alcançar os seus sonhos, é uma das principais recompensas e alegrias dos pais. Ou pelo menos, deveria ser.
Os pais “helicóptero”
O “overparenting”, “pais helicóptero” ou “maternidade de estufa” são termos utilizados para definir um perfil de pais nascidos a partir da década de 60/70 que começou a ter os seus filhos na universidade por volta dos anos 90/2000. Estes pais são superprotetores dos seus filhos, sempre na frente de combate para antecipar ou resolver problemas ou situações relacionadas com os seus filhos. São pais que supervisionam e controlam constantemente as atividades dos filhos, dando-lhes pouco espaço para explorar e descobrir livremente a vida e o mundo. Estes pais dão poucas oportunidades às crianças de correrem riscos, fazerem as suas escolhas e poderem aprender com os desafios da vida.
Os pais “helicóptero” são também extremamente exigentes com tudo. Educação, disciplina, desempenho académico, amizades, namoros, etc. Os filhos têm que se distinguir em tudo e serem os melhores, sendo que falhar ou desistir não são opções. E para tornar tudo isso como garantido, estão lá os pais sempre com as mangas arregaçadas, para garantir que nada corre mal. Mas não deveria ser esta a missão dos pais? Ajudar a que os filhos tenham o maior sucesso em tudo? Não, necessariamente. Aprender a caminhar pelos seus próprios pés e a lidar com os desafios da vida, é uma das maiores garantias de sucesso na vida.
Se por um lado, é aceitável que as crianças pequenas poderão precisar de ajuda e supervisão para as suas aprendizagens, ainda que de forma equilibrada, torna-se difícil imaginar este controlo na idade adulta. Pais como estes, entram nas faculdades, para pedirem satisfações aos professores pela nota obtida numa determinada disciplina. Pais como estes, entram em concursos de televisão para escolher uma namorada para os seus filhos. Pais como estes, cortam as asas aos seus filhos para crescerem de forma autónoma e saudável.
Dentro da categoria dos “pais helicóptero”, os psicólogos definiram três tipologias que se distinguem entre si pelo nível de proteção:
- os pais que estão constantemente a “pairar” sobre os filhos e a intervir limitando profundamente a sua capacidade de escolha;
- os pais que fazem questão de fornecer orientações, que apontam o caminho que consideram mais adequado mas sem limitar completamente a capacidade de decisão dos filhos;
- os pais que perante uma situação de perigo ou crise, intervêm para proteger os filhos até que estes se sintam com capacidade para seguir o seu caminho.
Este perfil de parentalidade surge como consequência das mudanças na sociedade, em que se passa de uma educação muito autoritária, baseada no medo, para uma educação demasiado liberal em que as regras e o papel de cada um na hierarquia familiar está pouco ou mal definido. As evoluções tecnológicas que permitem que a toda a hora e a todo o momento se possa estar em contacto, a mudança da estrutura familiar sendo que há cada vez menos filhos por casal e em que muitas vezes, o nascimento de uma criança resulta de um grande investimento a todos os níveis por parte dos pais. As crianças tornam-se, assim, tesouros e joias preciosas, que devem ser preservadas a todo o custo. As exigências laborais às quais os pais estão sujeitos e que levam à falta de tempo e de paciência para estar presente e disponível para a família, contribuem para que se confunda o estabelecimento de regras e de limites com a falta de amor e em que se tenta compensar os filhos com opções pouco benéficas para o seu desenvolvimento. É importante não esquecer que estes pais estão a educar
crianças e jovens numa sociedade que é cada vez mais heterogénea e aparentemente mais “aberta”, mas onde existe, mais do que nunca, uma pressão para a perfeição e para a excelência e onde a concorrência é cada vez maior e mais acentuada. Parece não haver tempo e espaço para o erro. Temos todos de aprender e saber o mesmo, e que se salve o melhor.